Dicendi?! Que mané dicendi!

Quando eu entrei nessa vida de escrita criativa, logo descobri que, além daquelas chatas aulas de português que a professora insistia nos livros de 18XX ou 19XX, eu precisava aprender mais sobre a técnica de escrever.

Foi aí que eu me deparei com a Dupla Demoníaca Massacradora de Iniciantes: Travessão e Dicendi.

Convenhamos: ao analisar o currículo escolar da maioria das entidades de ensino, por acaso eu os encontrei lá, mas você se lembra realmente de tê-los estudado na escola, seja no Ensino Fundamental ou no Ensino Médio? Bem, eu não.

Nas vezes que analiso textos enviados a mim para atribuir as chamadas Classes na Novel Brasil, não por acaso, esses são os itens que primeiro reparo. Digo isso porque são também o jeito mais fácil de identificar um iniciante de um outro que já apanhou, e muito, nesse ramo.

Também vejo por aí que existem milhares de páginas e artigos falando sobre eles, inclusive aqui, no Grimório do Escritor, falando sobre o bendito travessão. Sobre o ditos verbos dicendi, ou conhecidos também pelo nome de verbos de elocução, já li muitos artigos que explicam seu uso, exemplificam e realmente ajudam muito; ou pelo menos me ajudou.

A questão é que ao observar outros escritores “tomando cuidado” ao tratar com os verbos dicendi, notei que a grande maioria deles segue uma “fórmula”; fórmula esta que se assemelha muito a um exercício de matemática.

Peguem o Báskara para descobrir o valor do X potenciado a 2; peguem o Pitágoras para saber a altura desse prédio; e quando o trecho narrativo iniciar com verbo X, não coloque ponto na fala e deixe o verbo em minúsculo.

Bom, existem várias fórmulas por aí, sejam matemáticas ou de outras áreas, e você, caro escritor, pode ter aprendido os verbos dicendi dessa forma — e isso eu vejo como um problema. Vejamos:

— As fórmulas são suficientes. Me permitem tudo que quero fazer — joguei no ar.
— Façam da maneira X e Y — martelei em meus alunos.

Se você já estudou sobre verbos dicendi, pode estar confuso agora ou, se teve aulas comigo, já esteja familiarizado. Quem nunca viu nada sobre isso, calma que vou explicar passo a passo.

Verbos dicendi (ou verbos de elocução)

São verbos que indicam ou elucidam quem é o falante/locutor de um discurso direto e também podem indicar o modo como o discurso foi vocalizado. Veja:

— Adiante, a estrada se divide em dois. Siga à direita — explicou o comerciante que encontrei no caminho.

O verbo “explicou” desse trecho é o que é chamado de verbo dicendi. Esse verbo está indicando quem estava falando (3ª pessoa, ou seja, não é o narrador), quando ele falou (no passado, um pretérito perfeito) e de que forma (explicando educadamente) além de ser complementado pelo sujeito “o comerciante”, tornando tudo mais claro.

Verbos como esse são sempre falas do narrador que ajudam a explicar para o leitor as direções de onde vêm as vozes de um diálogo; ajudam você, autor, a deixar claro os participantes daquela história de forma viva.

Vocês podem encontrar na internet listas infinitas de coletâneas desses verbos e eis aqui a fórmula de como utilizá-los:

1. O verbo dicendi é grafado em minúsculo logo após a fala.

Formas como essas:

— Fujam! Eles estão vindo! — Gritou o capitão.
— Não seja tolo. Olhe aquilo — Falou o magro apontando para o leste.

estão erradas e deveriam ser assim:

— Fujam! Eles estão vindo! — gritou o capitão.
— Não seja tolo. Olhe aquilo — falou o magro apontando para o leste.

2. Não pontue a fala quando usar verbo dicendi.

A única pontuação entre a fala e o dicendi deveria ser o travessão, como a seguir:

— Eu quero me inscrever nessa guilda — falei para a moça do balcão.

Acontece que, quando a frase da fala for interrogativa (uma pergunta) ou exclamativa (um grito), pode ser sim colocado os pontos de interrogação e de exclamação sem alterar o verbo dicendi. Veja:

— Você quer o quê, baixinho? — perguntou a moça do balcão.
— Eu disse que quero me inscrever nessa guilda! — retruquei eufórico.
A regra da pontuação é somente para o ponto.

3. Se a fala foi interrompida com dicendi, ou seja, continua após o trecho do dicendi, não pontue o trecho narrativo e continue em minúsculo.

Veja como aconteceria:

— Mas, mocinho — respondia a moça do balcão em tom suave — você não parece ter idade para isso.

Nesse caso a fala foi interrompida pelo verbo dicendi antes que ela terminasse. O trecho, então, do dicendi não é pontuado para dar continuidade na frase.

A mesma fala pode ser escrita assim:

— Mas, mocinho, você não parece ter idade para isso — respondeu a moça do balcão em tom suave.

4. Verbos que indicam a ação não são verbos dicendi.

Não sendo verbos dicendi, as falas e trechos narrativos são tratados como frases separadas.

Veja:

— Eu preciso trabalhar aqui, moça. — Agarrei-me ao balcão, olhando bem nos olhos dela.

O verbo “Agarrei-me” até indica quem é o personagem, mas esse verbo não tem relação com a fala, mas sim com a ação que o personagem tomou ao dizer aquilo. Assim, fica em maiúsculo e com a fala pontuada.

5. Use o verbo dicendi no começo do trecho narrativo.

Não é recomendável que, ao utilizar o verbo dicendi, inicie o trecho narrativo com outras palavras, senão o dicendi. Tomando como exemplo:

— Entendi, mas você terá que passar pelo teste — disse a moça do balcão.

Podemos reescrever o trecho narrativo assim:

— Entendi, mas você terá que passar pelo teste — a moça do balcão disse.

Gramaticalmente não é errado dessa forma, mas prefira sempre começar com o verbo.

6. Não utilizar o dicendi quando a fala já indica o que o verbo quer dizer.

É muito comum encontrar textos de iniciantes assim:

— Pode deixar! Eu vou conseguir! — gritei.

ou assim:

— Você pode se dirigir ao campo de testes agora? — perguntou.

Ora, se o ponto de exclamação indica que a pessoa gritou e o ponto de interrogação indica que a pessoa perguntou, o verbo dicendi colocado ali é totalmente inútil. Está gastando o tempo do leitor. Retire-os.

Outra coisa que devem ter percebido é que as falas a partir do 2 tem continuado até aqui. Veja por completo:

— Eu quero me inscrever nessa guilda — falei para a moça do balcão.

— Você quer o quê, baixinho? — perguntou a moça do balcão.

— Eu disse que quero me inscrever nessa guilda! — retruquei eufórico.

— Mas, mocinho, você não parece ter idade para isso — respondeu a moça do balcão em tom suave.

— Eu preciso trabalhar aqui, moça. — Agarrei-me ao balcão, olhando bem nos olhos dela.

— Entendi, mas você terá que passa pelo teste — disse a moça do balcão.

— Pode deixar! Eu vou conseguir! — gritei.

— Você pode se dirigir ao campo de testes agora? — perguntou.

A pergunta é: pra quê tantos dicendi indicando, a cada fala, o personagem que fala, se as próprias falas já indicam isso? Afinal, são duas pessoas falando, uma respondendo pra outra, não? A resposta é simples: não precisa. Veja:

— Eu quero me inscrever nessa guilda — falei para a moça do balcão.

— Você quer o quê, baixinho?

— Eu disse que quero me inscrever nessa guilda!

— Mas, mocinho, você não parece ter idade para isso — respondeu em tom suave.

— Eu preciso trabalhar aqui, moça. — Agarrei-me ao balcão, olhando bem nos olhos dela.

— Entendi, mas você terá que passar pelo teste.

— Pode deixar! Eu vou conseguir!

— Você pode se dirigir ao campo de testes agora?

7. O dicendi é em minúsculo, mas a fala sempre começa em maiúsculo.

Essa dúvida geralmente ocorre quando temos o trecho narrativo começando o parágrafo da fala. Veja:

O guerreiro que me testou disse: — Você não passou. Pode voltar pra mamãe.

Não poderia ser, essa fala, escrita assim:

O guerreiro que me testou disse: — você não passou. Pode voltar pra mamãe.
A letra minúscula é só para o trecho narrativo com verbo dicendi após a fala. Para a fala, não.

Essas são algumas das regras que você pode também encontrar por aí na internet além desse blog. Agora vamos à parte que importa: o porquê dessas regras existirem.

O porquê das regras dos verbos dicendi.

De forma resumida, tudo isso é relacionado às regras de sintaxe, ou seja: orações, períodos, sujeito, predicado, objeto, etc.

Pode não parecer tão simples já que estamos falando de sintaxe — o terror de muitos escritores —, mas todas essas regrinhas do dicendi vêm de uma simples regra do “PERÍODO”:

O período de uma frase se inicia em letra maiúscula e termina com pontuação (ponto final/parágrafo/continuativo[.], ponto de exclamação[!] ou ponto de interrogação[?]), contendo um ou mais verbos no meio.

Se uma parte da frase começa com letra maiúscula ou minúscula, estamos sempre falando da regra dos períodos, exceto quando estamos falando de “Nomes”. Essas já são outras regras, afinal você não grafaria um trecho assim: “disse joão”, ou faria?

Enfim, o que quero dizer é que tais regras do verbo dicendi são diretamente ligados às regras de sintaxe de períodos, analisando a composição dos elementos que fazem uma fala.

Vamos observar duas frases:

— Eu falhei, mãe — disse eu.

O prato de sopa na mesa, colocou minha mãe.

Consegue ver a semelhança estrutural nas duas frases? A estrutura básica de um frase oracional é que tenham um sujeito, um predicado e pode conter complementos.

Sujeitos são entidades que exercem ou se situam na ação, estado ou processo indicado pelo verbo.

No caso, o "EU" de "Eu disse" e "MINHA MÃE" de "colocou minha mãe" são sujeitos. O verbo "disse" é uma ação executada por EU e o verbo "colocou" é uma ação executada por MINHA MÃE. Essa parte é fácil. Ao menos espero que seja fácil pra você.

Vamos ao predicado. Predicado é a composição entre o verbo e o objeto do verbo. O mais importante aqui — além do verbo, claro — é o objeto, que é o elemento da frase que sofre a ação do verbo, é alvo do verbo ou que é afetado pelo verbo.

"O prato de sopa" é o alvo de execução do verbo "colocou" na frase anterior. Ele é o que foi afetado diretamente pelo verbo, sendo deslocado de um lugar a outro pelo sujeito que executou tal ação. Isto é o objeto, e nesse caso é o objeto direto, sem uso de preposições entre o verbo e o objeto.

E o que isso tem a ver com a fala?

Primeiro, não tenha em mente que objeto seja um objeto material, como o “prato” nesse exemplo. Objeto de verbo tem relação com “objetivo”.

Segundo, falas são igualmente elementos que compõem uma frase quanto substantivos e outros tipos de palavras. Então eu sugiro que abstraia o "conteúdo da fala" com a sua importância na composição do texto em si.

Sendo assim, chegamos ao que importa: a fala. Isso mesmo, o substantivo "a fala". De agora em diante, entenda que toda a fala de um personagem é um substantivo como palavra e se torna um perfeito objeto para o verbo.

Do exemplo anterior "Eu falhei, mãe", que é uma fala do personagem, pode ser entendido na frase como "A fala disse eu".

Péra! Ainda não entendi! Vamos lá. A confusão pode ocorrer em alguns porque geralmente falas são colocadas na ordem indireta de orações. Onde uma oração deveria começar com o sujeito, então o verbo e só então o objeto ou outros complementos, uma fala na narrativa possui essa estrutura: objeto, verbo, sujeito. É o que chamamos de ordem indireta.

Vamos ajeitar as frases para que fiquem visualmente mais compreensíveis:

Eu disse: — Eu falhei, mãe.

Minha mãe colocou o prato de sopa na mesa.

Agora ficou mais fácil?

  • Eu disse "a fala".
  • Ela colocou "o objeto" na mesa.

Essa é a relação que a fala tem com o verbo dicendi. A fala é o objeto direto desse verbo e, portanto, parte da mesma oração e período.

Então, quando um personagem diz “Blá-blá-blá, bló-bló-bló”, ele diz “algo”, sendo esse “algo” qualquer coisa: uma fala completa, uma fala quebrada, um grito, uma respiração, uma frase marcante, angustiante, que seja; para a estrutura da frase em si, não passa de “algo”.

Voltando então para as regrinhas, vamos analisar um a um com o conhecimento que temos agora.

1. O verbo dicendi é grafado em minúsculo após a fala.

Se agora sabemos que a fala é o objeto da oração, logo concluímos que a fala e o verbo são partes da mesma oração; do mesmo período. Dentro de um período é tudo em minúsculo — exceto a letra inicial, oferecido pela fala, e Iniciais De Nomes.

É um fenômeno que é bem fácil de observar quando temos uma fala na ordem direta:

O capitão gritou: — Fujam! Eles estão vindo!

Ou seja, "O capitão gritou a fala" ou "A fala, gritou o capitão".

Em alguns casos é mais fãcil de observar isso com as aspas:

  • O capitão gritou: "Fujam! Eles estão vindo!".
  • >
  • "Fujam! Eles estão vindo!", gritou o capitão.
Ah, sim. Quando eu escrevo em ordem indireta da oração, coloco a vírgula logo após o objeto para que o leitor não confunda aquilo com sujeito. A fala não grita; quem grita é o capitão. Essa vírgula antes do "gritou" é vírgula de anteposição de termos da oração.

2. Não pontue a fala quando usar verbo dicendi.

Se a fala é parte da oração, logo não tem ponto dentro da oração.

— Eu quero me inscrever nessa guilda — falei para a moça do balcão.

Isso não poderia ser escrito assim: "A fala. falei para a moça do balcão". Que coisa, não? Trocar todas as “falas” por simplesmente “a fala”, na hora de analisar suas pontuações, revelam muita coisa.

Na ordem direta:

Falei a fala para a moça do balcão.

Ficaria estranho se fosse…:

Falei a fala. para a moça do balcão.

Ou mesmo:

Falei. A fala. Para a moça do balcão.
Usem e abusem dessa técnica. Técnicas de substituição ajudam também em várias outras matérias da gramática.

Um outro ponto a ser comentado nesta seção é em relação aos pontos de interrogação e de exclamação. É aí que entra uma certa liberdade e isso pode ser explicado um pouco mais no 7.

Nesse caso, somente o ponto continuativo é considerado como elemento sintático, ou seja, somente ele pode atrapalhar na interpretação do período. Já os pontos de exclamação e interrogação são pontuações de significado semântico: eles dão significado diferenciado à frase, alterando inclusive o tom da fala, para uma pergunta ou um grito.

A resposta é que não podemos retirá-los para que a frase não perca o seu significado, mas os desconsideraremos na análise sintática; somente na semântica.

3. Se a fala foi interrompida com dicendi, ou seja, continua após o trecho do dicendi, não pontue o trecho narrativo e continue em minúsculo.

Espero que se você leu tudo até aqui, já tenha tirado de letra. Se a fala "fragmentada" e o dicendi são todos partes da "mesma" oração, para quê eu vou fragmentá-los ainda mais com pontuações? Esse é mais fácil de analisar do ponto de vista da própria fala:

— Mas, mocinho, você não parece ter idade para isso.

Uma coisa interessante dos trechos narrativos com dicendi é que eles podem ser inseridos em qualquer lugar da fala, principalmente no lugar das vírgulas. E esse tipo de construção é bem incômoda para a análise sintática, pois seu efeito é: fragmentar o objeto. Veja:

Jogos, joguei eu, de RPG.

Aqui eu tenho uma fragmentação de objeto e seu complemento nominal. "Jogos de RPG" é o objeto da frase e o fragmentei em duas partes. Assim se faz nas falas fragmentadas em duas ou mais partes, como o substantivo e seu complemento.

A fala, respondia a moça do balcão em tom suave, dela.

Tudo em minúsculo e as duas vírgulas substituídas pelo travessão.

O mesmo não ocorreria se a fala fosse interrompida no final de seu período. Veja:

— Mas, mocinho, você não parece ter idade para isso — respondia a moça do balcão. — Você parece um bebê.

Nesse caso é só seguir a regra 1 e 2, pontuando o trecho com verbo dicendi antes de continuar na outra fala do mesmo persongaem.

Você observou que em dicendi no meio da fala utilizei o verbo no tempo pretérito imperfeito e, no final da fala, pretérito perfeito? Isso porque o próprio verbo pode indicar se a fala terminou o continuaria do ponto de vista da narração. Não é errado utilizar somente o pretérito perfeito, mas é mais uma opção que você pode ter na escrita.

4. Verbos que indicam a ação não são verbos dicendi.

Por mais que tenhamos listinhas e listinhas de verbos "considerados" dicendi, é aqui onde as regras são quebradas. Não falo de todas, mas somente essa regrinha. A regra do período é o que permanece.

Podemos, sim, utilizar verbos que a princípio não teria relações com falas, mas que seu contexto tem bastante ligação.

Verbos como "falar", "dizer", "explicar" e "responder" são bem claros no que diz respeito a sua relação com a fala. No entanto entramos em dúvida quando nos deparamos com expressões em que o verbo tem um uso semântico diferente do padrão.

Por quantas vezes ouvimos falar que "palavras martelavam na cabeça", ou que "as perguntas foram jogadas no ar"? Os verbos "martelavam" e "foram jogadas" têm alguma relação com falas? Eles têm, sim.

A expressão "martelar" significa "dizer repetidas vezes" e "jogar ao ar" significa "perguntar sem esperar pela resposta". Ou seja, elas contêm o verbo dicendi em seu significado e esses devem ser considerados na "regrinha".

Então quando eu escrevo:

— Façam da maneira X e Y — martelei em meus alunos.

poderia ser escrito:

— Façam da maneira X e Y — disse repetidas vezes aos meus alunos.

O verbo "martelei", então, é nesse caso um verbo dicendi por relação semântica, assim como qualquer outro verbo que possa ser substituído por um verbo dicendi comum sem perder o significado.

Se o verbo em questão tem a fala como objeto direto na oração, ele é um verbo dicendi e ponto. Pontuem e "minusculem" da forma como deve ser o verbo dicendi.

Só não façam isso com verbos que realmente não tem nenhuma relação com o ato de falar.

5. Use o verbo dicendi no começo do trecho narrativo.

Essa é uma regra que na verdade facilita o trabalho de todos. Agora que você tem um certo conhecimento sobre ordem direta e indireta de uma oração, vou te explicar que é um pouco difícil experimentar ordens que não sejam a direta ou a totalmente indireta.

Por totalmente indireta me refiro à ordem totalmente invertida, na qual o objeto começa a frase, seguido do verbo e terminado com o sujeito.

Se por um lado estamos acostumados a ler frases com Sujeito + Verbo + Objeto, por outro lado nas falas nos acostumamos com Fala + Verbo + Sujeito. E sempre que for executado dessa maneira, nenhum leitor sentirá estranheza ao ler e é muito mais fácil não errar no verbo dicendi quando ele já começa o trecho narrativo.

Como eu tinha dito, não é errado começar com outra palavra em minúsculo quando o trecho narrativo contém o verbo dicendi, mas é recomendável que se inicie com ele, pois facilita a vida de todos, principalmente na revisão em que ficam destacados todos os verbos dicendi coladinhos com o travessão.

6. Não utilizar o dicendi quando a fala já indica o que o verbo quer dizer.

Essa é uma regra que envolve diversos outros fatores que não se limitam ao dicendi ou ao trecho narrativo somente. Pode se estender para o parágrafo todo da fala e até a todo o diálogo.

Nesse ponto o verbo dicendi estaria cobrindo uma necessidade que o autor tem por uma falha da própria mídia de escrita.

Quando ouvimos pessoas falando em uma roda de conversas, não há um narrador anunciando quem está falando. Isso porque você está "vendo" quem fala e identifica também de onde vem a voz.

O mesmo acontece em mangás, animes, séries e filmes. Você tem o recurso visual para identificar o falante. Porém na escrita isso não é possível e, no entanto, ainda temos, como leitor, a necessidade de saber quem está falando.

É aí que entra o verbo dicendi para "auxiliar" nesse processo. Mas… você já parou para perceber que mesmo de olhos fechados às vezes conseguimos identificar aquele personagem de uma série ou anime somente pela sua voz? Um personagem que você já conhecia, claro.

Isso pode acontecer mesmo na escrita. Nós temos 2 principais recursos pra isso: Voz e Contexto.

A voz é literalmente a voz de um personagem, carregado de tom na fala, trejeitos e maneiras de se expressar próprio dele que um autor criou para aquele personagem. Então quando estiverem escritas palavras, expressões e frases que somente um personagem diria daquele jeito naquela obra, conseguimos identificá-lo sem "necessitar" de um verbo dicendi.

O contexto também pode ajudar nesse processo. Um exemplo muito utilizado é quando tiver apenas 2 personagens conversando. Se você identificar os dois no começo do diálogo, a mudança de parágrafos vai indicar de quem é a vez de fala; isso por si só já mata a charada para o leitor sem precisar colocar o verbo dicendi a cada fala, até porque é muito chato ler "disse fulano" se eu já sei disso.

Ou então, utilize os verbos de ação, mesmo, indicando que o personagem que executou a ação também é o falante.

Isso adiciona mais dinâmica às falas onde os corpos não ficam parados enquanto falamos.

Outra dica é que, se for utilizar o verbo dicendi, use para expressar tonalidade diferentes daqueles que as próprias pontuações já indicam. Ao invés de gritou, berrou; ao invés de falou, sussurou ou murmurou. São os chamados "verbos sentiendi".

7. O dicendi é em minúsculo, mas a fala sempre começa em maiúsculo.

Essa é uma regra que pode te confundir ainda, mesmo tendo lido tudo até aqui, mas pode ser entendida de uma maneira simples.

O conteúdo da fala de um personagem não é o objeto do verbo dicendi, mas somente o "ato" de falar.

O que acontece é que o que é falado durante a fala é considerado uma outra frase em relação ao trecho narrativo. Por isso podemos ter falas longas com várias orações e períodos e no final termos o verbo dicendi em minúsculo. Veja:

— Eu não esqueci do meu dever. Um dia me vingarei — murmurou o guerreiro.

Nesse trecho observamos que há pontuação e, portanto, a presença de mais de um período na fala, e isso nem um pouco influenciou o verbo dicendi.

Assim, consideramos a fala toda como um "empréstimo" de uma frase de fora dali. Sendo um empréstimo, ela obedece à regra de onde ela veio e não do período do dicendi.

O conteúdo da fala, portanto, deve ser analisado com suas próprias regras dentro da fala e somente observar a interação com o verbo dicendi como um todo.

Então quando a fala terminar e vier o verbo dicendi, se exclui o ponto, pois o ponto pertencerá ao trecho narrativo, mas antes disso não.

E quando tiver o verbo dicendi antes e a fala a seguir, começa em maiúsculo porque ali dentro é uma outra frase.

Eu vou ficando por aqui, espero que tenha gostado e agradeço a quem leu este artigo. Caso tenha encontrado mais dúvidas ou informações curiosas sobre os verbos dicendi, por favor comente aqui ou me procure.

Escrito por: Kamo Kronner

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