19 dicas de diálogos

Por KRISTEN KIEFFER e traduzido por Brinn.

Durante anos, me bati bastante com os diálogos nas minhas histórias. Eu não tinha o talento natural para escrever conversas que parecessem reais e fiéis aos personagens e acabei permitindo que essa fraqueza me impedisse de me esforçar em melhorar. Porém, histórias precisam de diálogos e os meus estavam sofrendo com essa falta de atenção.

Por fim, decidi que já estava na hora de parar de ignorar o problema e comecei a ler cada sugestão sobre como escrever diálogos melhores nas quais consegui colocar as mãos. Eu estudei os livros que já havia lido e reescrevi as conversas em minhas próprias histórias uma vez após a outra, até que finalmente comecei a ver algum sinal de melhora.

E, acima disso, entendi que os diálogos são por si só um dos atributos mais complexos da literatura.

Infelizmente, é por essa complexidade que se torna tão difícil escrever um diálogo de qualidade. Então, neste artigo de hoje, eu resolvi dividir em dezenove passos para se escrever bons diálogos, começando por dez dicas para se produzir conversas mais ricas e complexas.

#1: CADA LINHA DE DIÁLOGO DEVE SERVIR PARA ALGUM PROPÓSITO

Os diálogos não devem existir apenas para que os seus personagens digam alguma coisa.

Muito pelo contrário, as conversas literárias mais eficazes são aquelas que servem para vários propósitos como, por exemplo: explorar seus personagens, avançar o enredo, aumentar a tensão, revelar algum contexto, estabelecer a ambientação e assim por diante.

Se você puder remover uma linha de diálogo do seu manuscrito — ou, ainda pior, uma conversa inteira — sem impactar a compreensão dos leitores sobre a sua história, então há uma boa chance de que esse diálogo não tenha um propósito ou uma direção relevantes.

#2: NÃO SEJA REALISTA

Os escritores costumam ser encorajados a escrever diálogos realistas. Contudo, na ficção, existe um negócio chamado ser realista demais.

Pense em todas as coisas supérfluas que fazem parte das suas conversas no dia a dia: a conversa fiada, os murmúrios, aquelas simples frases que acabam sendo repetidas umas três vezes até serem ouvidas. Esses momentos com certeza tem o seu lugar na ficção, mas apenas quando o autor tem algum propósito para eles.

O diálogo mais “realista” não é aquele que imita a linguagem que você ouve no dia a dia; é aquele em que as vozes dos seus personagens parecem genuínas.

#3: DESENVOLVER UMA VOZ É CRUCIAL

Escolha três personagens da sua história e escreva uma conversa sobre se a pizza é ou não a maior comida criada pela humanidade — sem usar indicadores de diálogo. Será que os leitores seriam capazes de discernir qual personagem disse cada linha?

O termo “voz” costuma ser aplicado às formas verbais não verbais pelas quais um personagem se comunica de acordo com a sua personalidade, experiências, crenças, auto-estima, visão de mundo e influência culturais. Quanto mais fortes forem as vozes dos seus personagens, mais autênticas serão as suas conversas.

#4: AS PESSOAS NEM SEMPRE DIZEM O QUE PENSAM

As pessoas são criaturas complexas. Nós raramente dizemos o que queremos do jeito que pensamos. Ao invés disso, nós nos moldamos de acordo com os arredores, esforçando para nos encaixar ou nos destacarmos, para deixar uma marca profunda, para agradar ou apaziguar.

Por isso não é de se surpreender quando os diálogos mais diretos soam tão falsos. Escrever conversas com nuances que levam em conta as vozes e as circunstâncias pode ser complicado, mas sempre vale o esforço.

#5: AS RELAÇÕES TÊM UM PAPEL CHAVE NAS CONVERSAS

Falando de circunstâncias, cada conversa é moldada pelo contexto em que ocorre, em especial no que tange as relações entre seus personagens.

A forma como um casal conversa sobre o tempo deve ser diferente da forma como essa mesma conversa se desenrola entre um pai e um filho distantes, entre colegas de trabalho ou entre dois estranhos na rua.

#6: USE LINGUAGEM CORPORAL E EXPRESSÕES

As expressões e a linguagem corporal das pessoas podem dizer tanto quanto suas palavras. A postura, o contato visual, os maneirismos e as reações também devem desempenhar um papel proeminente nas conversas entre seus personagens.

#7: NÃO TENHA MEDO DE FAZER BAGUNÇA

As conversas de verdade raramente ocorrem em frases perfeitinhas e educadas. Afinal, as pessoas são uma bagunça — assim como os seus diálogos. Dessa forma, não tenha medo de permitir que seus personagens conversem em sentenças fragmentadas ou inacabadas, de assassinar a gramática e usar gírias, de xingar até não poder mais.

#8: EQUILIBRE AS PARTICIPAÇÕES

Escrever diálogos entre quatro ou mais personagens pode ser desafiador. Por sorte, é raro que tantas vozes compartilhem o mesmo peso em uma conversa. Quando for escrever cenas assim, resista à vontade de garantir que cada personagem diga tanto quanto os outros. Ao invés disso, deixe que as dinâmicas de poder se desenvolvam naturalmente.

#9: TRABALHE COM A TENSÃO DA CENA

Quase todos os diálogos na ficção existem para criar ou resolver de alguma forma a tensão. Afinal, é ela que faz os leitores continuarem a virar as páginas, ansiosos para descobrir o que vai acontecer a seguir.

Para garantir que o diálogo não deixe a sua história estagnada, preste atenção especial aos fluxos de tensão em cada cena. Como você pode manipular a tensão por meio dos diálogos de uma forma que mantenha os leitores engajados?

#10: VOCÊ NÃO PRECISA ESCREVER CADA DETALHE

Nem sempre é necessário colocar os diálogos palavra por palavra no papel. Muitas vezes, é mais fácil trabalhar com certos detalhes mundanos, como cumprimentos ou palavras de aceitação, na própria narrativa — ou simplesmente deixar para os leitores deduzirem essas informações por si mesmos.

Cada palavra que você escreve tem o poder de entediar os leitores ou desacelerar o ritmo da sua história, então tenha certeza de escolher suas palavras (e de seus personagens) sabiamente.

Nesse ponto, você já deve ter adquirido uma maior compreensão sobre como dar nuances aos seus diálogos e torná-los mais imersivos. Agora, vamos voltar nossa atenção para a parte técnica de como escrever bons diálogos.

#11: CORTE OS INDICADORES DE DIÁLOGO DESNECESSÁRIOS

Indicadores de diálogo existem para esclarecer quem está dizendo o que, sendo que os indicadores mais comuns são: disse, perguntou e respondeu. Outros indicadores comuns (ex.: gritou, sussurrou, rosnou) expandem em como determinada linha de diálogo foi dita.

Apesar de sem dúvidas serem um aspecto importante das conversas ficcionais, indicadores demais também podem desacelerar o ritmo da sua história — ou até fazer os leitores perderem todo o interesse. Sendo assim, utilize-os com cuidado.

#12: DICENDI NÃO ESTÁ MORTO

A clareza fornecida pelos indicadores muitas vezes pode ser vital, mas lembre-se de que eles também são um sinal de autoria (ou seja, um elemento da narrativa que não é escrito na voz do personagem cujo ponto de vista está em destaque).

Um ou outro sinal de autoria não irá atrapalhar a imersão dos leitores, se já estiverem engajados, porém, quanto mais natural os seus indicadores parecerem, melhor. Os leitores passarão direto por palavras como “disse” e “perguntou”, mas ainda serão capazes de registrar a identidade dos falantes, garantindo que sua história continue fluindo.

#13: UTILIZE INDICADORES DE AÇÃO NO LUGAR

Indicadores de ação são pequenas ações atribuídas que antecedem ou seguem uma linha de diálogo, como nos seguintes exemplos:

Amanda amassou a barra da própria camisa. — Eu não sei se isso é uma boa ideia.

— Você tem certeza de que é isso o que você realmente quer? — Brad arqueou uma sobrancelha.

Usar indicadores de ação é uma forma excelente de atribuir um diálogo ao mesmo tempo em que mantém os leitores engajados e adiciona movimento à cena.

#14: ESCOLHA INDICADORES DE DIÁLOGO FORTES

Se você for usar um indicador de diálogo, é importante esclarecer o tom no qual ela dita, então escolha os indicadores com cuidado. Considere “sussurrou” no lugar de “ela perguntou baixinho” ou “rosnou” no lugar de “ele disse com um tom desagradável”.

#15: USE INDICADORES REALÍSTICOS

Vários escritores erroneamente utilizam ações atributivas no lugar de indicadores atributivos — um erro gramático que com certeza deixa os editores loucos.

Aqui estão dois exemplos de como ações atributivas são utilizadas de forma inadequada:

— Eu não acredito nisso. — Emma suspirou.

— Isso é hilário — gargalhou Henry.

A menos que você seja um super humano, você provavelmente não consegue suspirar ou gargalhar palavras, ainda assim, é exatamente isso o que as sentenças acima implicam. Ao invés disso, vamos dar uma olhada em duas formas de atribuir da forma correta essas linhas de diálogo:

— Eu não acredito nisso. — Emma disse com um suspiro.

Emma suspirou. — Eu não acredito nisso.

— Isso é hilário! — Henry gargalhou.

— Isso é hilário! — disse Henry, gargalhando.

Consegue ver as diferenças entre eles? Seu diálogo não precisa ser completamente realista, mas os seus indicadores com certeza precisam ser.

Quer aprender melhor sobre como pontuar todas as formas de diálogo? Dê uma lida nesse artigo.

#16: CORTE FORA AS REDUNDÂNCIAS

Vários escritores inexperientes também cometem o erro de ser redundantes em seus diálogos. Não há a necessidade de escrever “— Ugh! — Ela gemeu,” ou “— Ha! — Ela riu,” quando apenas um ou outro é o suficiente.

#17: EVITE A REPETIÇÃO DE NOMES

As pessoas raramente se referem umas às outras pelos seus nomes a menos que estejam tentando chamar a atenção uma da outra. Ainda assim, vários escritores têm o costume de colocar os nomes de seus personagens a torto e a direito no meio de seus diálogos.

— Annie, pare com isso. Você está me fazendo rir demais.

— Foi você quem começou com isso, Michael.

— Talvez, Annie. Mas você é quem está me matando aqui!

Percebe o quão falso isso parece? Se essa forma de se comunicar com outras pessoas é comum na cultura do seu personagem ou serve para um propósito específico na sua história, então tudo bem. Caso contrário, uma repetição de nomes tão frequente assim só vai acabar afastando seus leitores.

#18: USE DIÁLOGOS PARA QUEBRAR A NARRAÇÃO

Uma narração que se alonga por páginas e mais páginas pode acabar se tornando cansativa de ler, por mais teoricamente empolgante que ela possa ser. Adicionar uma linha ou outra de diálogo no meio pode ser uma excelente forma de dar um descanso aos leitores, em especial se você permitir que o seu personagem em destaque entre em contato ou reaja ao mundo ao seu redor.

#19: LEIA O DIÁLOGO EM VOZ ALTA

Mesmo após colocar todas essas dezoito dicas na prática, ainda pode ser difícil dizer se você escreveu um diálogo eficaz ou não.

Na minha experiência, a forma mais fácil de determinar se a conversa entre os seus personagens parece realista ou não é lê-la em voz alta. Os seus personagens soam como eles mesmos? A conversa deles segue um ritmo natural? Se a resposta for não, lê-las em voz alta com certeza o ajudará a descobrir onde você errou.

Se sentindo sobrecarregado com todos os conselhos que eu compartilhei hoje? Não sinta como se você tivesse que dominar a arte de escrever diálogos do dia para a noite. A prática é a chave para melhorar sua habilidade e aperfeiçoar qualquer parte do seu manuscrito requer uma boa dose de revisão. Concentre-se em implementar apenas uma ou duas dessas dicas por vez, assim, quando você menos esperar, já estará escrevendo conversas ricas e engajantes.

Este artigo foi escrito por Kristen Kieffer e traduzido por Brinn, membro ilustre da Novel Brasil. Nós, Kamo Kronner e Remi, fizemos apenas a edição. Obrigado por terem lido.

Escrito por: Kamo Kronner

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